Um velho ditado português diz que quem vive no inferno acostuma-se com o diabo.
Será mesmo verdade?
O ditado português, muito usado no mundo, principalmente no Brasil, tem lá suas implicações.
Quando se coloca o inferno no centro das coisas, entende-se que o inferno é o que vivemos hoje, aqui na terra mesmo e o diabo somos todos nós.
Na ótica portuguesa nós, pobres mortais, chegamos ao inferno e acabamos por gostar de lá.
Naturalmente que não é um amor à primeira vista. É uma coisa que vai acontecendo aos poucos, bem devagarinho.
Uma reclamação aqui outra reclamação ali e nenhuma providência.
Aí o tempo vai passando, passando… uma nova reclamação ali outra acolá e nada de providência.
Nesse andar vagaroso acabamos por nos acostumar.
E quando nos acostumamos perdemos a vontade de lutar, perdemos a vontade de nos libertar.
E quando se perde a vontade de lutar, é o fim.
Quando se perde a vontade de lutar ficamos com a visão turva, distorcida. Perdemos a identidade e passamos a considerar normal tudo o que acontece em nossa volta.
Até mesmo os maiores absurdos são considerados normais.
Como dizia Mário Lago, quando o homem perder a esperança, pode apagar o arco-íris.
Acostumar-se com o inferno e com o diabo representa na sabedoria portuguesa aquela situação em que se joga a toalha.
No Boxe, por exemplo, quando o treinador joga a toalha sinaliza que seu atleta está desistindo de continuar a luta.
No Piauí muitos fizeram isso.
Aliás, no Piauí, a luta acabou bem mais cedo.
Muitos desistiram antes mesmo do soar do gongo.
Antes de soar o gongo jogamos a toalha; sequer esperamos por um último suspiro; não esperamos nem mesmo por aquele último suspiro que encerra a vida.
Fugimos do ringue bem antes disso.
Aceitamos a derrota. Ou melhor, aceitamos a supremacia do diabo do ditado português.
E com isso passamos a considerar que o inferno é o melhor dos lugares. Passamos a achar o inferno uma maravilha.
Mesmo sabendo que o inferno não representa nenhuma maravilha.
O inferno nada mais é do que a covardia de quem se recusou a lutar.
Nada mais é do que a covardia de quem recuou antes do soar do gongo, covardia de quem não quis prosseguir lutando.
Como bem diz o sábio, covarde é aquele que não tenta.
Covarde é aquele que não se esforça por um mundo melhor.