23/11/2024

Geral

Crise no transporte público de Teresina acumula quase cinco anos de prejuízos à população

Entre paralisações, tentativas de acordo e até uma CPI, usuários do sistema aguardam por soluções concretas

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Publicado por: FM No Tempo 20/11/2021, 11:02

Matéria de Eduardo Costa

O sistema de transporte público de Teresina sempre passou por dificuldades e foi alvo de críticas da população. Greves eram recorrentes, mas não tiravam a tranquilidade de quem precisa pegar ônibus, pois acordos entre trabalhadores e empresários eram firmados rapidamente e logo a circulação dos veículos voltava a sua normalidade.

Em 2017, as crises tomaram novas proporções. Segundo o Sindicato das Empresas de Transportes Urbanos de Teresina (Setut), houve uma redução significativa na quantidade de passageiros, que culminou na queda de arrecadação das empresas.

Fachada de sede do Setut na Avenida Maranhão (Foto: Reprodução/Google Maps)

Segundo o sindicato, a demanda caiu de 220 mil passageiros por dia, em 2017, para em média 45 mil, cerca de 20% da demanda anterior. Mas com auxílio da gestão da Prefeitura de Teresina, à época, que fazia repasses mensais às empresas, o sistema foi mantido. Porém, as greves continuavam devido aos atrasos dos repasses dos subsídios da prefeitura.

Mesmo diante da crise, em 2018 foi criado um novo sistema de circulação do transporte público de Teresina: o sistema Inthegra. Investimentos foram realizados na tentativa de melhorar a vida dos usuários; novas estações de passageiros, terminais e faixas exclusivas para ônibus foram implementadas.

De acordo com o Tribunal de Contas do Piauí (TCE-PI), a Prefeitura Municipal, através da Superintendência de Transportes e Trânsito (Strans), utilizou mais de R$ 15,6 milhões para a construção e implantação dos corredores exclusivos; mais de R$ 1,9 milhão para fornecimento e instalação do sistema de automação para portas automáticas para as estações de passageiros nos corredores exclusivos; e mais de R$ 1,2 milhão na contratação de serviços de construção e implantação dos abrigos de ônibus para pontos de paradas. Todos os contratos foram firmados de 2017 a 2020.

Usuários aguardam ônibus no Terminal Livramento, na zona Sudeste de Teresina (Foto: Divulgação/Strans)

Como toda mudança demanda adaptação, a população teresinense teve que se habituar ao novo modelo, que também foi alvo de muitas críticas. As principais são falta de segurança, superlotação e demora para passagem dos ônibus. Teresa, como quis se identificar, é estudante e usuária do transporte coletivo. Ela afirma não se sentir segura nos pontos de espera.

“Eu não me sinto segura mesmo naquelas paradas novas, nos terminais. E quando tem mais gente na parada sempre tem o risco de arrastão. Essa crise mudou a rotina, agora não tenho muita certeza dos horários que os ônibus passam e quando chegam estão quase sempre bem lotados”, disse a estudante.

Todas as reclamações atreladas ao alto preço da passagem fizeram com que os usuários cobrassem cada vez mais por melhorias no sistema, que sofreu restrições como redução da frota de ônibus e fechamento dos terminais no início de 2020 devido à pandemia e, logo em seguida, parou totalmente o seu funcionamento por falta de pagamento de motoristas e cobradores.

Motoristas e cobradores deflagraram greve no sistema de transporte coletivo (Foto: Divulgação)

Com a troca de gestão em Teresina e o problema já instalado, a cobrança por soluções passou a ser ainda maior. Durante todo o período de paralisação do setor, que durou mais de um ano, os contratos com as empresas de ônibus foram alvos de investigação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara Municipal de Teresina. Ao fim da investigação, um relatório produzido pelos vereadores recomendou a suspensão do contrato com as empresas.

Com a recomendação nas mãos da prefeitura, um novo acordo foi proposto aos consórcios, com diversas alterações no funcionamento do sistema. As principais delas foram o aumento da frota, controle da bilhetagem eletrônica sendo realizada pela Strans, gratuidade para os alunos da rede municipal e revisão no valor das tarifas. Após contrapropostas e conversas com o Setut, um acordo extrajudicial foi firmado entre as partes e homologado na 2ª Vara da Fazenda Pública de Teresina.

No acordo, a Prefeitura deve efetuar em parcelas o pagamento para os quatro consórcios. Mas, para que haja a continuidade do pagamento, alguns critérios devem ser cumpridos. O procurador-geral do município Aurélio Lobão ressaltou que no último mês de outubro foi firmado um acordo entre a Prefeitura e os consórcios de transporte coletivo em Teresina, no qual o valor de R$ 4,5 milhões foi repassado a todas as empresas, dividido equitativamente entre cada uma delas.

“Nesse termo de acordo que foi homologado em juízo ficou determinado que o pagamento da segunda parcela deverá somente acontecer se os consórcios pagarem os seus trabalhadores, se os consórcios honrarem com as ordens de serviço emitidas pela Strans e se não houver paralisação. Então para que haja o pagamento da segunda parcela no valor de R$ 3 milhões é necessário o comprimento dessas cláusulas”, assegurou o procurador.

Procurador-geral do município garante acordo entre Prefeitura e consórcios (Foto: Ascom/PGM)

Mesmo com o acordo, o prefeito Dr. Pessoa (MDB) decretou, em 28 de outubro, calamidade pública no transporte coletivo. O decreto prevê descumprimento dos termos dos acordos judiciais e tem prazo de 180 dias, buscando adotar medidas para a contratação emergencial de empresas de transporte coletivo e dar continuidade à operação do transporte público em Teresina.

Segundo Lobão, o decreto foi assinado devido ao excesso de paralisações e para que não houvessem mais prejuízos aos usuários do transporte público.

“Em virtude dessas paralisações que já foram preliminarmente reconhecidas como ilegais, o prefeito Dr. Pessoa baixou um decreto de calamidade exatamente para que quando a Strans emitisse uma ordem de serviço e essa não fosse cumprida na sua totalidade, os serviços serem complementados por uma empresa que será cadastrada junto a Strans. Então, hoje é essa a realidade do transporte coletivo no município. A prefeitura está adotando todas as medidas legais para que a população não sofra com essas dificuldades que se arrastam há mais de cinco anos na execução desses contratos prestação de serviços”, enfatizou o procurador.

O coordenador técnico do Setut, Vinicius Rufino, informou que o todos os termos do acordo estão sendo cumpridos pelos consórcios, e que atualmente, a frota em circulação está acima do percentual determinado pela Justiça, que é de 70% em horário de pico e 30% em horário de entrepico.

“As empresas têm cumprido à risca o que foi determinado. A frota foi ampliada e tem saído inclusive acima do percentual determinado pela Justiça. Nesse momento estamos trabalhando sempre dentro dessa margem. Em relação aos pagamentos, está sendo tudo repassado da forma que foi acertado no acordo. A expectativa é de conseguir de fato retomar e oferecer esse serviço com a qualidade que o passageiro necessita”, destacou o coordenador.

Coordenador do Setut destaca números da frota de veículos em circulação (Foto: Reprodução)

Mesmo com acordos firmados e, segundo o Setut, cumpridos, motoristas e cobradores deflagraram nova greve, que fez com que a Prefeitura e a entidade ingressassem com ações cíveis públicas para o fim do movimento. No dia 10 de novembro, em assembleia, o Sindicato dos Trabalhadores Rodoviários (Sintetro) anunciou o fim da paralisação, o que fez com que o transporte público de Teresina retomasse a sua normalidade. Atualmente a frota é de 200 ônibus.

Antônio Cardoso é motorista e um dos representantes da classe durante todo esse período de crise. Segundo ele, a greve foi suspensa após a categoria decidir por dar um voto de confiança para o Setut efetuar o pagamento dos acordos.

“A greve se deu por conta da convenção não ter sido assinada. Não foi uma greve com adesão em massa da categoria, porque muitos trabalhadores tinham receio naquele momento de ficar sem o pagamento que era para ser feito e algumas coisas estavam se ajustando. Mas claro que ainda precisamos da convenção para que os nossos direitos como trabalhadores sejam assegurados”, disse o motorista.

Trabalhador do sistema esteve à frente da categoria em meio à crise (Foto: Arquivo Pessoal)

Mesmo com a retomada dos ônibus, os terminais de integração continuam fechados para utilização do sistema de transporte. Nesse momento, estão sendo utilizados como postos de vacinação drive-thru contra a Covid-19. Em setembro, a Prefeitura iniciou a limpeza e a manutenção das estações e dos terminais de ônibus da cidade, que tiveram aparelhos de ar condicionado furtados, além de luminárias, cadeiras, lixeiras, vidros, portas e sensores quebrados.

O orçamento para esses serviços foi de R$ 2,1 milhões, segundo a administração do município. Os trabalhos contemplaram 61 estações e oito terminais e foram realizados pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Semduh), em conjunto com as Superintendências de Ações Administrativas Descentralizadas (SAADs). Cada SAAD ficou responsável por executar a limpeza e a reforma das estações de sua zona.

O gerente de planejamento da Strans, Felipe Leal, ressalta que estudos estão sendo realizados para que os terminais voltem a funcionar.

“Estamos elaborando estudos frequentemente para volta dos terminais. Ainda não tem uma data certa para volta, mas os estudos estão bem avançados. Por enquanto estamos no sistema radial, tendo o percurso como pontos finais de viagem entre o bairro e o centro da cidade, mas em breve a gente vai dar uma boa resposta para a população. Além disso, geramos semanalmente um relatório de quantidade de passageiros e da frota operante. Estamos vendo uma crescente número de passageiros e estamos analisando as possibilidades de incremento na frota”, relatou Felipe Leal.

Felipe Leal afirma que superintendência estuda volta dos terminais (Foto: Ascom/Strans)

O usuário do transporte coletivo Ednardo Abreu, acredita que a solução para o problema seria a contratação de novas empresas.

“Eu não acredito no retorno dessas empresas. Para mim elas já faliram faz tempo. Estão há anos no sistema e oferecem pouca estrutura para os usuários dos ônibus. Para mim a solução seria a troca definitiva, trazendo outras empresas, porque as que estão aí são muito precárias”, pontuou.

A verdade é que o teresinense que utiliza somente o ônibus como meio de locomoção espera por uma solução que oferte quantidade atrelada a qualidade dos serviços no transporte público, pois há quase dois anos vem sofrendo com a falta e a precariedade dos veículos em circulação e já não aguenta mais a incerteza de quando vai poder sair ou retornar para casa.

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