Já disse aqui algumas vezes que no Brasil adoramos cortar alguma coisa.
Desde que alguma coisa dos outros.
Adoramos tirar, mas adoramos tirar dos outros.
Adoramos tirar, desde que não tirem o nosso. Cortem de todos, menos dos meus.
Na verdade, sentimos prazer diante do sofrimento alheio.
Se você já sentiu um prazer secreto ao ver alguém levando a pior, saiba que não está sozinho. Muitos pensam igual a você.
É uma sensação comum, igual àquele ditado popular que diz que pimenta nos olhos dos outros é refresco.
Especialistas que estudam o tema indicam que esse sentimento costuma surgir por diferentes motivos.
Costuma surgir, por exemplo, a partir do momento em que entendemos que o infortúnio alheio é uma coisa merecida. Costuma surgir partir do momento em que aceitamos a tese de muitos de que pobre é teimoso, é preguiçoso e que pobre nasceu para sofrer.
Estamos vivendo uma situação parecida agora quando, mais uma vez se fala em reforma da previdência.
Em nenhum momento se fala em dar.
Em nenhum momento se fala em oferecer, em ceder ou conceder.
Fala-se sempre em tirar.
Há, portanto, um justificado temor em meio à população de que a reforma da previdência, se efetivada, vai, como sempre, prejudicar os mais necessitados, vai prejudicar exatamente os mais pobres.
Mas por que tirar dos mais pobres? Por que tirar daqueles que nada tem e por isso mesmo mais precisam da atenção do poder público?
Será o pobre o verdadeiro culpado pela situação da previdência brasileira?
Essa situação nos leva sempre a perguntar por que as pessoas sentem prazer em prejudicar os outros.
Prejudicar os outros, menos os seus.
É justo uma pessoa que ganha milhões decidir quanto deve ganhar aquele que não tem nada? Eis a questão.
Quanto deve ganhar um miserável na visão de quem tem muito?
A maioria dos que têm muito geralmente considera que dar mais a quem tem pouco é uma ameaça ao status dos ricos.
Puro egoísmo.
O pobre brasileiro não quer o lugar de ninguém. Nunca quis.
O pobre brasileiro quer apenas ter o direito à sobrevivência com um pouco de dignidade.
O pobre brasileiro quer apenas o direito à saúde.
Quer apenas o direito a justiça.
Quer apenas o direito à velhice.
O pobre brasileiro não quer morrer novo.
O pobre brasileiro quer trabalhar.
O pobre brasileiro quer, acima de tudo, ter o direito de ser cidadão em seu próprio país.
Só isso basta!