Quem pagará o enterro e as flores
Se eu me morrer de amores?
Quem, dentre amigos, tão amigo
Para estar no caixão comigo?
A Opinião desta quinta-feira é dedicada a Vinicius de Moraes, grande nome da cultura brasileira.
São exatamente 40 anos de sua morte, se é que se pode afirmar que ele realmente morreu, pois há sempre quem diga que um poeta não morre nunca, viverá para sempre.
Quem, em meio ao funeral
Dirá de mim: — Nunca fez mal…
Quem, bêbado, chorará em voz alta
De não me ter trazido nada?
Quem virá despetalar pétalas
No meu túmulo de poeta?
É verdade verdadeira. O poeta não morre. Então, se é assim, Vinicius continua aqui entre nós, mais vivo do que nunca;
Quem me dirá palavras mágicas
Capazes de empalidecer o mármore?
Quem, oculta em véus escuros
Se crucificará nos muros?
Quem, macerada de desgosto
Sorrirá: — Rei morto, rei posto…
Quantos, os maxilares contraídos
O sangue a pulsar nas cicatrizes
Dirão: — Foi um doido amigo…
Quem, criança, olhando a terra
Ao ver movimentar-se um verme
Observará um ar de critério?
Quem, em circunstância oficial
Há de propor meu pedestal?
O poeta é como sua obra, a poesia. Poeta e poesia são imortais. Ele pode até partir fisicamente, mas a sua poesia fica na nossa alma até seguirmos o mesmo caminho.
Outros virão:
Quais os que, vindos da montanha
Terão circunspecção tamanha
Que eu hei de rir branco de cal?
Qual a que, o rosto sulcado de vento
Lançara um punhado de sal
Na minha cova de cimento?
Quem cantará canções de amigo
No dia do meu funeral?
Qual a que não estará presente
Por motivo circunstancial?
Poeta é sempre poeta… Não morre nunca.
Distancia-se talvez de um tempo vivido.
E permanece nos sonhos dos outros.
Cutucando a alma através das palavras…
Quem cravará no seio duro
Uma lâmina enferrujada?
Quem, em seu verbo inconsútil
Há de orar: — Deus o tenha em sua guarda.
Qual o amigo que a sós consigo
Pensará: — Não há de ser nada…
Quem será a estranha figura
A um tronco de árvore encostada
Com um olhar frio e um ar de dúvida?
Quem se abraçará comigo
O material do poeta é a vida, por isso parece que a poesia é a mais humilde das artes, diz o próprio Vinicius de Moraes.
A morte vem de longe
Do fundo dos céus/
Vem para os meus olhos
Virá para os teus/
Desce das estrelas
Chega impressentida/
Nunca inesperada
Ela que é na vida
A grande esperada! /
A desesperada
Do amor fratricida /
Dos homens, ai! dos homens
Que matam a morte
Por medo da vida./
Vinícius de Moraes vive, definitivamente, Vinícius vive!